segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Dilema

Ah, se eu soubesse como me fazer feliz,
rasgava todas as teorias que eu fiz,
acreditando saber muito sobre tudo e tudo o que eu me pergunto
É se a felicidade na verdade está no seu amor...

Ah, se o impossível era passível de querer
queria eu ser seu amor possível
Possivelmente te querer é minha fuga
E eu fujo, constantemente...

De ti, não quero nada a não ser somente sua,
Imaginando que essa minha vida dura
um dia vai cessar, vai cessar

e aí,

Eu poderei viver somente por prazer,
Prazer em conhecer, sou o seu amor,
Que à sua porta bate sem nenhum pudor,
despida da cabeça aos pés,
vestida apenas da vontade
de morrer de amor.

sábado, 15 de novembro de 2014

Engraçado o universo

Engraçado o universo
fragmentar nossos planos
esmigalhar nossas esperanças
mudar o rumo
do nosso destino
improvável, incerto
apesar de nossas andanças
e nossas tantas convicções
tudo se esvai
em apenas um segundo

Atravessou a rua antes
porque saiu de casa antes
porque tomou banho antes
porque se lembrou
do seu atraso recorrente
e das tantas reclamações
De qualquer forma,
havia acordado mais cedo
porque dormiu cedo antes
porque o livro estava chato
porque a luz estava fraca
porque o dia tinha sido cheio
porque foi promovido
e porque se lembrou
de seu atraso recorrente
ai então, de qualquer forma,
porque dormiu cedo antes,
porque o livro estava chato,
porque a luz estava fraca,
porque o dia tinha sido cheio,
porque foi promovido,
e porque se lembrou
do seu atraso recorrente,
e das tantas reclamações
tomou banho antes,
saiu de casa antes,
atravessou a rua antes,
e o carro passou
e esmigalhou as esperanças
e o universo mudou o rumo
do destino
E apesar de nossas andanças
e nossas tantas convicções
tudo se esvai
em apenas um segundo

Engraçado, o universo.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Dom Casmurro

                 Costumo ler de tudo, pesquiso sobre a vida dos escritores e tenho fases de obsessão, dependendo do momento da minha vida. Quando eu era pré-adolescente, por exemplo, tinha fixação por Pedro Bandeira. Lia todos os livros infanto-juvenis do escritor, até que eu entrei para o Ensino Médio. Eu gostava de Clarice Lispector antes dela assinar frases fictícias filosofando sobre a vida em timelines aleatórias no Facebook. Tive a fase Luis Fernando Veríssimo, porque sempre achei este senhor muito culto e irônico, além de carregar o estigma de ser filho do grande Érico Veríssimo. Ponto pra ele.

             Quando ia acampar com minha irmã, lia Martha Medeiros. Lembro que a gente ia para a beira da Lagoa, ela com a cara ensopada de protetor solar, camiseta, chapéu, o medo de pegar sol e o livro Montanha Russa, da Martha. Teve uma época que eu tava mais pro suspense, então devorava Agatha Christie e todos os assassinatos desvendados brilhantemente por Hercule Poirot.

              Ultimamente estou meio obcecada por escritores novos, como o Gregório Duvivier. O cara tem vinte e oito anos, é escritor, roteirista, ator, comediante, inteligente, esquerdista e lindo. Espero ansiosa pela segunda-feira, dia de publicação na sua coluna semanal na Folha de São Paulo, um dos meus poucos prazeres nesse dia cruel. Além disso, teve seu novo livro, "Put some Farofa" elogiado  e recomendado por nada mais nada menos que meu velho Veríssimo. Porém, talvez nenhum escritor tenha me intrigado tanto durante minha formação como leitora e observadora-reflexiva como Machado de Assis. Todo mundo na época de colégio torcia o nariz para as obras do escritor, talvez pela linguagem rebuscada do final do século XIX e por buscarem leituras que estivessem ligadas ao universo adolescente. Não sei. Só sei que ele me ganhou com Dom Casmurro. Lembro que li para o vestibular, depois reli por prazer e li pela terceira vez com um olho clínico, uma percepção de detetive, inspirada no Poirot na tentativa de desvendar o assassinato do amor de Bentinho por Capitu, que morreu aos poucos, sufocado pelo orgulho e pela dúvida da traição. Fiquei dias, semanas, meses, tentando encontrar uma resposta. Sem sucesso. Nem eu nem grandes estudiosos da obra de Machado de Assis encontraram respostas para tal enigma literário.

              A mesma sensação que algumas pessoas têm ao ler sobre o amor de Edward e Bella ou sobre a descrição detalhada do mundo mágico de Harry Potter eu tive diversas vezes lendo Dom Casmurro. Eu fechava o livro e os olhos e imaginava cada cena. Bentinho penteando os cabelos de Capitu. O beijo. A esperteza de Capitu ao fingir para a mãe que nada aconteceu. A descrição do autor para os olhos da moça: "olhos de ressaca". Quer algo mais profundo e poético do que isso? Olhos que, assim como o mar em dias de ressaca, arrasta tudo para dentro de si. "Olhos de cigana obliqua e dissimulada". Fiquei sem ar e sem chão lendo esse livro. Machado descrevia cada cena com uma riqueza poética e metafórica que me deixou apaixonada pela história de Bento e Capitolina. Até que o livro acabou, pela terceira vez. E virou minissérie. E conseguiu manter a genialidade e a poesia do livro, para minha satisfação.

          Ah, se esses leitores de meia tigela que gastam tempo publicando frases e pensamentos de escritores que nunca leram soubessem o valor de um bom Machado de Assis. E de Clarice Lispector, quando não for uma frase aleatória atribuída a ela filosofando sobre a vida, da forma mais clichê possível.

domingo, 9 de novembro de 2014

G(D)ramática

Em todos os meus predicados,
As ações envolvem você
A gente ama, briga, canta
Tudo na mesma oração
Absoluta, confusa, complexa
Ás vezes fico indeterminado
Quando você vai embora
E eu me escondo, me perco
Decido então ser sujeito simples
Sozinho, posso até me bastar
Mas a vida fica meio incompleta
E eu acho que a gente combina
Enquanto sujeito composto.










quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Antes

Antes aquela rua tinha uma grama farta e verde nas calçadas, antes havia crianças brincando ate tarde e a vida era mais simples.
Antes o portão do vizinho era de madeira, a casa não tinha reboco e o sobradinho do outro lado da rua era uma loja de roupas, antes.
Antes o muro alto dividia a casa do vizinho, antes eu pulava o muro pra brincar. Antes eu provocava o cachorro, que tentava me alcançar no alto do muro.
Antes o pai tinha bicicleta, depois moto, depois moto e bicicleta, depois carro, Antes a família era grande. Antes a vó era viva.
Antes tinha banho de piscina de plástico, antes tinha guaraná de garrafa a oitenta centavos, antes tinha pião e ioiô. Antes tinha carnaval de clube, antes tinha bolhas de sabão, antes tinha sandália da Xuxa. Antes a irmã namorava no portão, e eu escondido. Antes tinha a prima morando ao lado de casa. Primeira e melhor amiga. Antes tinha promessas de amizade eterna.

Depois a grama morreu, o portão de madeira ganhou pintura, e depois foi substituído por um de ferro. A parede ganhou reboco e a loja de roupas fechou.
Depois o muro ficou baixo e eu alta. Depois o muro ganhou grades e eu responsabilidades.
Depois o cachorro foi levado para outra cidade, e depois morreu. Depois o pai teve a bicicleta roubada, a moto vendida, o carro amassado e depois diabetes.
Depois a vó morreu. Depois a família diminuiu.
Depois a piscina furou, depois o guarana de garrafa foi substituído pela coca zero. Depois o clube fechou e levou embora o carnaval. Depois o pião e o ioiô tornaram-se obsoletos.
Depois a sandália ficou pequena. Depois a irma casou, e eu namorei no portão.
Depois a prima se mudou. Depois a prima teve filho. Depois a prima casou.
Os amigos também se mudaram, casaram e tiveram filhos. Inclusive o amor de infância. Depois nunca mais houve contato. As amizades eternas eternizaram o esquecimento.
Depois a rua ficou vazia. E chata.

O antes tem gosto de saudade. O antes é um vídeo-game Dynavision. O antes é o almoço de pascoa, o antes é o presente embaixo da árvore de natal e a espera pela meia-noite. O antes é o primeiro dia de aula da pré-escola. O antes é a primeira professora. O antes é uma tarde de Chaves e Chapolin na TV.

A gente era feliz e não sabia. Isso antes.